O que significa o resultado das eleições alemãs para a ação climática? E como isso Impacta a Europa e o Mundo.
A Alemanha pretende reduzir as emissões provenientes do carvão, petróleo e gás em 65% até 2030. No entanto, as ambições climáticas não representaram uma prioridade nas recentes eleições no país. Políticos, especialistas em energia e ativistas partilham as suas esperanças e receios.Os resultados das eleições federais na Alemanha deixaram as políticas relacionadas com as ações climáticas do país em terreno incerto.O partido conservador União Democrata-Cristã (CDU) de Friedrich Merz, obteve 28,6% dos votos no domingo e deverá juntar-se aos sociais-democratas, de centro-esquerda, para formar uma nova coligação.A Alternativa para a Alemanha (AfD) obteve a segunda maior percentagem de votos, mas uma "barreira" contra os partidos de extrema-direita, erguida desde a Segunda Guerra Mundial, pode indicar que não serão convidados para o Governo.Entretanto, os Verdes, viram a sua percentagem de votos cair para 11,6%. Um "resultado respeitável" ou uma "derrota esmagadora", para o partido que faziam parte da antiga coligação que se desfez em novembro.Trata-se de mais um sinal de como a "onda verde" - que obteve resultados significativos nas anteriores eleições de 2021 - recuou na Europa. Os Verdes foram afastados do governo na Áustria, Bélgica e Irlanda, e perderam nas eleições para o Parlamento Europeu no verão passado.Sendo a maior economia da Europa, o maior emissor de gases tóxicos e a maior potência de energias renováveis, a Alemanha tem uma influência enorme no nosso clima. Qualquer alteração nas políticas climáticas pode ser altamente significativa para o bloco e para o resto do mundo.O que é que as eleições dizem sobre as prioridades climáticas da Alemanha?Em contraste com 2021, quando todos os partidos, exceto a AfD, se comprometeram a atingir emissões zero até à metade do século, as promessas climáticas estiveram claramente ausentes desta campanha eleitoral.Quando o clima foi mencionado pelos candidatos nos vários debates, geralmente aconteceu de uma forma negativa ou "morna"."A proteção do clima precisa de uma economia forte", foi a frase principal da União Democrata-Cristã (CDU) sobre o assunto. O líder da CDU e futuro chanceler deixou claro que a economia está em primeiro lugar, afirmando, num discurso pré-eleitoral, que faria política "para a maioria que consegue pensar corretamente... e não para os malucos verdes e de esquerda".O manifesto do bloco conservador prometia reverter uma série de políticas verdes que se tinham revelado fraturantes para o anterior governo, como o aumento da venda de veículos elétricos e de bombas de calor."A campanha eleitoral da CDU/CSU não foi apenas ignorante - em vez de apresentar soluções para o verdadeiro desafio da crise climática, agiu contra as principais conquistas da política climática dos últimos anos", afirma Carla Reemtsma, porta-voz do grupo de jovens Fridays for Future (FFF). "A crise climática é, e continua a ser, a crise mais urgente do nosso tempo. O facto de ter sido destituída e menosprezada nesta campanha eleitoral por razões táticas foi errado e irresponsável", acrescenta Pauline Brünger, ativista do FFF Alemanha.A segurança e a economia estão no topo da lista das preocupações do público alemão, seguidas da justiça social e das questões migratórias, segundo revelaram as sondagens do grupo Forschungsgruppe Wahlen.Mas seria errado concluir que os alemães deixaram de se preocupar com a crise climática.Ciarán Cuffe, copresidente do Partido Verde Europeu, fala-nos sobre uma pesquisa no dia das eleições que "mostrou que o clima, o ambiente e a energia continuam a ser as três principais preocupações dos eleitores alemães".Em 2023, uma sondagem do Eurobarómetro revelou que 77% dos alemães consideram as alterações climáticas um "problema muito grave".Porque é que a ação climática continua a ser do interesse da Alemanha?A Alemanha pretende reduzir as emissões provenientes do carvão, petróleo e gás em 65% até 2030 e alcançar a neutralidade climática até 2045 - um objetivo relativamente ambicioso, consagrado na Lei de Proteção do Clima."Esperamos que a Alemanha mantenha o rumo", diz à AP Linda Kalcher, do grupo de reflexão Perspetivas Estratégicas, com sede em Berlim. Mas, segundo ela, espera-se uma "mudança de tom"."Muitas das políticas que o novo governo vai apresentar podem não ser em nome do clima, mas serão em prol da prosperidade, da inovação e da competitividade", mesmo que o objetivo final seja o mesmo, diz.A posição dos conservadores relativamente ao clima parece ambivalente. Apesar de "apoiarem firmemente" o objetivo de emissões líquidas nulas até 2045, estão a rever as políticas para lá chegar. Mas, felizmente, o progresso da Alemanha em matéria de energias limpas faz sentido do ponto de vista económico e de segurança e, por isso, é provável que continue a avançar a bom ritmo.ComTrumpa desmantelar a ação climática nos Estados Unidos, "há uma necessidade e uma oportunidade" para a Alemanha continuar a desempenhar o seu papel de líder climático, afirma Marc Weissgerber, do grupo de reflexão sobre o clima E3G."É crucial manter o ritmo, não só para a redução das emissões, mas também porque isso acabaria por fazer baixar os preços da eletricidade a médio prazo e reduzir a dependência das importações de combustíveis fósseis", diz à AP Julia Metz, especialista alemã em política climática e diretora do grupo de reflexão Agora Industry.A UE precisa que a Alemanha "ressurja como motor de uma Europa ousada e assertiva", acrescenta Manon Dufour, diretora executiva do E3G Bruxelas. "A ação climática será um pilar fundamental de qualquer estratégia credível de segurança e resiliência, tanto para a Alemanha como para a Europa".Que políticas climáticas irá o novo Governo alemão introduzir?A política industrial verde tornou-se a principal forma de discutir as alterações climáticas na UE. A organização climática E3G, por exemplo, apela ao Governo alemão que apoie ativamente o novo acordo industrial limpo do bloco .Mas a ação climática assume, naturalmente, muitas outras formas. "Os conceitos de proteção social do clima já existem há muito tempo", afirma Reemtsma.A eurodeputada enumera "a expansão dos transportes públicos, os subsídios às bombas de calor, a expansão das energias renováveis e do aquecimento urbano, os programas de formação nas indústrias do futuro, a ajuda direta em caso de catástrofe - tudo isto financiado por impostos dos super-ricos e por investimentos, em vez de ser feito à custa das escolas, dos caminhos-de-ferro e das prestações sociais".O manifesto da CDU/CSU é variado no que respeita a estas questões. O partido comprometeu-se a abolir a lei do aquecimento doméstico, que estipula que todos os sistemas de aquecimento recentemente instalados têm de ser alimentados por, pelo menos, 65% de energia renovável.Também vai tentar reverter a proibição da venda de novos carros a gasolina e a gasóleo em toda a UE, que deverá entrar em vigor em 2035. O SPD, que declarou que o futuro dos automóveis reside na mobilidade elétrica, poderá moderar esta posição.Resta saber como é que esta provável nova coligação irá traçar uma rota para a neutralidade climática. Enquanto o SPD defende políticas mais drástricas para descarbonizar o aquecimento e os transportes, a CDU dá prioridade à fixação do preço do carbono.O grupo CDU/CSU também se comprometeu a "criar o quadro necessário" para a captura e armazenamento de carbono (CCS), uma tecnologia controversa que os ativistas vão acompanhar de perto."Friedrich Merz tem de decidir", acrescenta Reemtsma, da Fridays for Future. "Vai continuar a ser um dos homens que queimam o mundo ou vai finalmente reconhecer o que a realidade ecológica e a maioria das pessoas há muito exigem?"https://pt.euronews.com/green/2025/02/26/o-que-significa-o-resultado-das-eleicoes-alemas-para-a-acao-climatica